Têmporas


É uma situação efetivamente bela, e passa o dever de trazer diversas coisas à lembrança. Ninguém vive só com a própria linha de sombra, vive também com sua linha de luz. A luz se transforma em sombra, a sombra se transforma em luz.
Eis que ainda somos pessoas novas; não ainda uma só; mas já somos uma só, embora sejamos duas. Eu, porém, pareço triste, talvez esteja somente séria e comovida.
Cintila um brilhante no peito dele e uma flor branca, em meus cabelos, mas são brilhos desiguais. Resplende também o vinho. Vinho – este sim! Seja o vinho vida em outro homem; o homem – é amor – irradiai, mutuamente, a vossa vida.
Quantas palavras, quantos corações. “Acompanhar-vos-emos, iremos convosco pelos pórticos e depois, pelas ruas, andaremos juntos alguns passos, milhentos passos, com entusiasmo, sorriso sincero, até aqui, até aqui.” Juntos.
Mas aparecerão, depois, os veículos, a rua será um obstáculo, mas subiremos no automóvel – devemos, afinal, ficar sozinhos. Voltemo-nos para as estrelas, para o calor, para os sentimentos. Ah, como o homem deseja ser amado, como queremos estar perto um do outro.
Árvores, árvores, troncos altos e esguios, que escondem o cimo aos olhares e roubam dos olhos a lua distante, trezentos mil quilômetros, e são dois. E a lua se transforma num tambor que rufa no fundo dos olhos e dos corações.
O amor. Vibra o amor nas têmporas. O amor na inteligência se transmuda em pensamento e vontade: vontade minha de ser dele. Vontade dele de ser meu.
Entranho, porém necessário afastar-se, depois, um do outro. Porque o homem não consegue permanecer no outro para todo o sempre. E o homem não é tudo.
Como alcançá-lo?
Como ficar nele para sempre?
Como alcançar-me?
Como permanecer para sempre em mim?
Como obtê-lo, se o homem não consegue ficar no outro, se o homem – não é tudo?
O corpo... O pensamento corre pelo corpo, mas não encontra nele a satisfação. E também, para o amor, o corpo não é mais do que um meio. Procuremos um apoio em nossos corpos, enquanto existem, procuremos apoio para o nosso amor.

Vitória Tavares

Um comentário:

Talk dirty to me...